Neste dia santo, em que celebramos o nascimento do Senhor, a liturgia nos apresenta este acontecimento salvífico a partir de dois prismas: o primeiro o possui um cunho mais narrativo-descritivo que corresponde ao relato do Evangelista Lucas proclamado na missa de vigília celebrada ontem à noite. Aí, Lucas põe o dado central de nossa fé, a saber: o Filho de Deus nasceu, em Belém, no período em que Quirino era governador da Síria. Nasceu em estábulo, no meio dos animas, pois não havia lugar para eles na hospedaria. Os pastores foram os primeiros a receberem o anúncio do anjo: o menino é um recém-nascido, envolto em faixas, está com sua mãe e pai.
A grandeza do referido relato reside no fato de que o Evangelista Lucas precisa as circunstâncias de tempo e espaço no qual o Filho de Deus se encarnou e se fez homem. O nascimento do Filho de Deus, portanto, não é uma ilusão ou mais um mito de cunho religioso que fala de certa habitação de um deus no meio dos homens; ao contrário, aqui, trata-se de uma realidade histórica concreta: o Filho de Deus altíssimo tornou-se homem, habitou em nosso meio, assumiu para si nossa humanidade, a nossa carne e sangue, as nossas dores, alegrias e vicissitudes.
Na missa de hoje, ouvimos o Evangelho de São João que escreve uma espécie de Teologia da Encarnação. Ou seja, João faz uma espécie de comentário do factum proclamado ontem por Lucas, comentário este que nos faz compreender as implicações da encarnação de Jesus para nossa vida prática, para o nosso cotidiano.
João, no seu prólogo, começa referindo-se a Jesus como o Verbo, como a Palavra que existe desde o princípio (arkh) que estava voltada para Deus, que Deus. Aqui, claramente há uma referência ao Livro do Gênesis: Deus que cria todas as coisas através do poder de sua palavra: “e Deus disse: ‘faça-se a luz’ e a luz se fez”. A Palavra de Deus é apresentada com um caráter performativo, ou seja, ela e capaz de realizar aquilo que significa. Segundo São João, esta Palavra de Deus é uma pessoa, uma pessoa divina, é o próprio Deus (v.1). Essa Palavra toma carne, se faz homem e habita de uma maneira inteiramente nova e definitiva em nosso meio.
Uma melhor compreensão de Jesus como a Palavra encarnada do Pai, nos é comunicada quando ouvimos a carta aos Hebreus. Nela nos é dito que “Deus, de muitos modos, falou aos nossos pais, nesses dias que são os últimos, nos falou por seu Filho” (Hb 1,1-2). Aqui, compreendemos o ponto alto dessa teologia. Jesus é a Palavra definitiva de Deus aos homes: nele Deus disse-nos tudo o que havia para ser dito. Jesus é, segundo a Dei Verbum, Deus que se faz homem para de um modo humano, falar aos homens quem é Deus. Portanto, Jesus não possui apenas uma opinião sobre Deus, mas ele possui uma palavra autorizada, credível que é pronunciada cheia de autoridade.
Os antigos, diante deste evento salvífico da encarnação do Filho de Deus, se perguntaram: cur Deus homo? (Por que Deus se fez Homem?). No final das contas, a pergunta pode soar assim: ‘por que Deus se fez homem?’. ‘Se foi para a nossa salvação, não havia outro modo?’. ‘Por que dessa maneira?’ A resposta dada a esta pergunta nos remete diretamente ao sentido do mistério celebrado por nós hoje. Deus, segundo os antigos, se fez homem para a nossa salvação. Salvação, no entanto, não é apenas a remissão dos pecados, mas a participação na vida do próprio Deus. Então, no final das contas compreendemos que Deus se fez homem para que os homens se tornassem deuses.
Deus se fez homem para que a nossa vida humana fosse elevada a estatura de Jesus Cristo, homem como Deus pensou. Neste sentido, é possível compreender as palavras de São João: “a Palavra estava no mundo — e o mundo foi feito por meio dela — mas o mundo não quis conhecê-la. Veio para o que era seu, e os seus não a acolheram.
Mas, a todos que a receberam, deu-lhes capacidade de se tornarem filhos de Deus”. (Jo 1,11-12). A escuta da Palavra é o modo concreto através do qual, novamente, esta palavra toma carne em nós novamente. Assim sendo, quando damos ouvidos a esta Palavra, também nós nos tornamos filhos, no Filho.
Mas, a todos que a receberam, deu-lhes capacidade de se tornarem filhos de Deus”. (Jo 1,11-12). A escuta da Palavra é o modo concreto através do qual, novamente, esta palavra toma carne em nós novamente. Assim sendo, quando damos ouvidos a esta Palavra, também nós nos tornamos filhos, no Filho.
É graças à encarnação de Jesus que as portas do céu se abriram para nós. Entre terra e céu não há mais aquela distância abissal que existia entre criatura e criador. A amizade entre nós vai sendo restabelecida, pois tudo aquilo que foi assumido na encarnação será definitivamente remido na cruz e ressurreição do Senhor.
Pe. Elton Santana dos Santos.
Coordenador da Pastoral Vocacional Arquidiocesana.
Pe. Elton Santana dos Santos.
Coordenador da Pastoral Vocacional Arquidiocesana.